Conhecimento que transforma: parceria possibilita biblioteca aos colaboradores de indústria brusquense


Foto: Anderson Vieira

O Brasil não é um país de pessoas que tem o hábito da leitura. De acordo com dados de 2016 do Instituto Pró-Livro, o brasileiro lê em média 2,43 livros por ano, índice considerado baixo.

Para se ter uma ideia, uma pesquisa similar ocorreu na França em 2019. Lá, o estudo apontou que a média de leitura é de 21 livros ao ano.

Mas se houvesse mais incentivo? As coisas mudariam?

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Como a leitura nos faz imaginar, vamos exercitar neste momento a nossa imaginação:

Imagine agora que você pudesse trabalhar em uma empresa que facilitasse esse acesso, proporcionando aos seus colaboradores uma biblioteca, no qual eles tivessem à sua disposição quase 4,5 mil títulos divididos entre livros, dvds, gibis e periódicos.

Imaginou? Quantas oportunidades de desenvolvimento pessoal poderiam existir dentre esses livros? Já imaginou que tipo de pessoa você se transformaria com todo esse conhecimento à disposição?

Agora vamos parar de imaginar, pois em Brusque, no interior de Santa Catarina, esta biblioteca existe. Ela está à disposição dos funcionários da empresa Irmãos Fischer.

A empresa atua em todo território nacional nos segmentos de eletrodomésticos e equipamentos para construção civil, incluindo casas e telhas para grandes construções. A empresa, que também tem projeção internacional, nasceu de uma pequena oficina de bicicletas aberta em 1961 por Ingo Fischer.

Com o passar do tempo os irmãos ingressaram no negócio e hoje a Fischer reúne um complexo industrial de 150 mil m² em uma área de mais 3,6 milhões e está localizada às margens da Rodovia Antonio Heil, no bairro Limoeiro.

A Biblioteca

Irmãos que dirigem a Fischer inauguram biblioteca em julho de 2014. Foto: Divulgação/Fischer

A biblioteca nasceu em 24 de julho de 2014 através de uma parceria entre a Fischer, a Federação das Indústrias de Santa Catarina (FIESC) e Serviço Social da Indústria (SESI) intitulada Indústria do Conhecimento.

O investimento na época  foi de R$ 344 mil. Na parceria, a empresa entrou com toda estrutura física em uma área de 176 m² e os demais parceiros com todos os títulos da biblioteca e um profissional para trabalhar nela.  Além de todo o acervo, a estrutura conta com laboratório de informática para os colaboradores poderem fazer trabalho de faculdade, pesquisas ou acessar a internet.

Os funcionários podem aproveitar a biblioteca durante os intervalos e também pegarem livros para ler em casa. Em Santa Catarina, além da Fischer em Brusque, outras três empresas de cidades diferentes contam com biblioteca para trabalhadores dentro do programa indústria do conhecimento. As bibliotecas ficam em Jaraguá do Sul, Blumenau e Tubarão.

De acordo com a gestora do Departamento de Responsabilidade Social e Sustentabilidade, Karla Fischer Boos, a biblioteca nasceu com o objetivo de proporcionar um lugar tranquilo aos funcionários de modo que eles pudessem ler e usar os laboratórios da informática.

“O objetivo da Fischer sempre foi proporcionar a qualidade de vida para os funcionários dentro da empresa. Na época nós já tínhamos a academia, onde o funcionário poderia fazer exercícios fora do turno de trabalho sem custo algum, tínhamos a sala de aula para os estudos, porque muitos deles não tiveram a oportunidade de continuar a estudar para entrar no mercado de trabalho e aí implantamos a biblioteca”, relata.

A empresa também tem uma parceria com a prefeitura da cidade, onde mantém uma creche para os filhos dos funcionários e também para os moradores das proximidades da empresa. Nesta parceria, a Fischer arca com a manutenção da estrutura física e a prefeitura com os professores.

A gestora afirma que, com a implantação da biblioteca, notou que os colaboradores ficaram mais interessados na leitura . “Existe a possibilidade de levar os livros para casa e também para as crianças. Então eles tem um contato maior com o livro. Querendo ou não, a cidade possui uma biblioteca pública, mas a possibilidade de eles saírem do trabalho e irem até o centro é mais remota. A biblioteca despertou neles a cultura da pesquisa”.

Desde a implantação, muita transformação se viu. Karla explica que muitos funcionários conseguiram, a partir deste movimento, a conclusão do ensino médio e a possibilidade de cursar uma faculdade. “É um grande orgulho  ver o seu funcionário com o diploma do ensino médio e ver que ele pode ir adiante para uma faculdade e almejar um melhor futuro para a família”, finaliza.

As leitoras

Cerca de 700 colaboradores estão cadastrados e podem usufruir do acervo da biblioteca. Foto: Anderson Vieira

Mas os funcionários estão satisfeitos com a possibilidade de ter uma biblioteca tão perto, no seu emprego? O Olhar do Vale procurou conhecer pessoas que pegaram um grande número de livros nos últimos meses. Os dados levantados foram do mês de junho e nos levou a três pessoas de diferentes idades. Conhecemos a Jamile, de 25 anos, a Elisabete, de 39 anos e a Terezinha, de 51 anos.

Jamile prefere livros de autoajuda. Foto: Anderson Vieira

A Jamile das Virgens dos Santos é natural de Buerarema na Bahia e mudou para Brusque há três anos, a procura de mais qualidade de vida. Está na Fischer há dois anos.  Ela atua como Operadora de Montagem. Acorda cedo, às 4h e  começa no emprego às 5h. Vem do bairro Santa Rita, onde reside, com o ônibus da empresa, que passa na frente da sua casa.

Jamile conta que sempre gostou de ler. No mês de junho pegou 17 livros.  “Eu já gostava de ler, sempre fui de comprar livros, mas na empresa tive um maior contato com a literatura. ” Eu gosto de livros de psicologia, de autoajuda também, mas também leio romances”, afirma.

Já Elisabete de Oliveira Garcia, de 39 anos , que também é operadora de montagem, é

Elisabete também leva livros a sua filha de seis anos. Foto: Anderson Vieira

natural de São Paulo , trabalha há cinco anos na empresa e tem uma filhinha de seis anos.  A rotina dela é diferente, pois traz a sua filha junto que fica na creche oportunizada pela a empresa até o fim do expediente de Elisabete.

Além de livros para ela, Elisabete leva livros para a sua filha. E olha que a menina é exigente; sempre cobra estorinhas  antes de dormir. “Eu achei essa ideia (da biblioteca) maravilhosa , pois eu não tinha muito contato com livro. Assim eu pego pra mim e a minha filha”, relata.

Elisabete conta que a atitude vem transformando o pensamento da sua filha. “Eu levei a estorinha do Chapeuzinho Vermelho contada de outra forma e ela adorou e ela dá a opinião dela sobre a estória”, ri.

Elisabete pegou em junho dez livros. “Eu tinha parado no tempo quanto a leitura. Aqui a gente tem acesso então lê mais”, comenta a operadora que também aproveita os horários de intervalo para ler na biblioteca.

Terezinha é fã de livros de auto ajuda e culinária. Foto: Anderson Vieira

E de sorriso fácil, mas envergonhada, Terezinha Aparecida Ribeiro trabalha na empresa há 12 anos. Veio de Curitibanos -SC há 12.   Terezinha começou a usar a biblioteca faz três anos. Pegou nove livros em junho.  Ela também chega na empresa às 5h.

Ela conta que os livros estão ajudando ela a vencer a timidez.  “Além de livros sobre autoajuda eu gosto de livros de culinária”, afirma.

O incentivo à leitura

Foto: Anderson Vieira

A biblioteca conta hoje com 700 funcionários da empresa aptos a pegarem livros, dvds, jornais e gibis por empréstimo de sete dias. O local conta com uma funcionária cedida pelo SESI. Trata-se da administradora Maria de Lourdes Sabino, de 62 anos, que responde pela biblioteca.

A responsável realiza várias atividades para que as pessoas se interessem mais pela leitura. Uma delas é o levantamento semestral das necessidades dos trabalhadores. “Existe uma caixa de sugestão onde os colaboradores podem mencionar o livro que desejam ler e quanto faço esse levantamento, o livro é adquirido. Houve uma necessidade de livros em inglês, pois tinham vários colaboradores que estavam estudando o idioma e adquirimos esses livros”, explica.

“Com a publicação da atividade no mural da biblioteca e da empresa, as mães se sentem motivadas a participarem também”, explica Maria de Lourdes. Foto: Divulgação

Além disso, Maria incentiva a leitura das mães com suas filhas através da cabaninha, onde a ideia é que a mãe faça uma cabana com a sua filha em casa e leia estorias para ela. Depois as mães mandam a foto e ela coloca num mural da biblioteca, motivando outras mães. “Para as mães é uma maneira de conviver com a criança, de ler a estorinha , principalmente antes de dormir. Tem criança que cobra:  você não vai ler estorinha para mês?”, ressalta.

Para fomentar a leitura da criançada existe uma forma de um”pedágio que deve ser pago”: “Para quem retira um livro deve tirar mais cinco gibis”, comenta.

E como se não bastasse, através do trabalho dela e da biblioteca foi possível também trazer pessoas que haviam parado de estudar de volta ao estudo.

” A minha função dentro do Sesi é mobilizar. Eu sou mobilizadora. Eu vou até as empresas em geral e tento conversar com os funcionários para que eles voltem a estudar.

“O SESI oferece o ensino à distância, Educação de Jovens e Adultos (EJA),  que fica na Rodrigues Alves, no centro e  aqui é um espaço para divulgar. Tem muitos que resistem, mas a gente procura conversar e plantando uma sementinha, até que eles concordam e mudam a sua vida”, finaliza.

Texto: Anderson Vieira

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